"- Alô?
- Oi, sou eu. O que foi aquilo?
- Aquilo o quê?
- Não desconversa. Quando acordei já não estavas
mais.
- (…)
- Eu disse que
precisava de você pra dar o nó na minha gravata.
- Meio cedo pra essas dependências. Esta situação
não me deixa confortável. Mas como foi?
- Foi fácil atar o nó da gravata perto da missão
que é desatar teu coração.
- Falo da reunião.
- Não quero falar de trabalho. Quero falar de nós
dois. Quero falar de amor.
- “Amor”. Eu não gosto de dar nome às coisas.
- Tenho pena do teu siamês então. Os outros gatos
devem rir do fucinho dele nos encontros de telhado e lua cheia.
- (Risos)
- Viu? Eu te faço rir. Nós separados, o tempo passa
lento, rápido, agonizando, depende do dia. Nós juntos, o tempo passeia. Somos
ótimos. Deixa eu entrar na tua vida de vez, vai. O resto a gente vê depois.
- Eu não estou acostumada a ter alguém me mimando.
Na verdade não sei exatamente o que é isso que está acontecendo.
- O mundo te convenceu que não existe isso que eu
quero te dar. Errei?
- Acertou. Os outros caras fizeram esse trabalho.
- Não sou os outros caras. Sou eu, com toda
redundância. E ter perdido algumas vezes não a faz uma mulher menor. Quem
fechou seu corpo foi você, eles só sugeriram que o fizesse. Você obedeceu
calada. E daí se você não está acostumada a ser amada? Eu também não estava
habituado a comer alimentos sólidos quando nasci, mas encarei. A vida é isso,
encarar as coisas que acontecem. Sem fugir.
- Não quero me machucar.
- Você quer evitar os medos para evitar a dor? Nem
Pitágoras entende essa matemática. O resultado é uma vida sem riscos então.
Isso? Adrenalina pura.
- Clichê.
- Mas serve pra nós dois.
- Quando eu disse que já sabia onde isso daria, não
queria estar no controle da situação, só não queria assistir o mesmo filme de
novo.
- Eu limpo teus lençóis sujos dessas paixões
canalhas que você teve. Só precisa deixar meu amor abrir tua porta.
- Clichê, parte dois. Tá parecendo letra de pagode
já.
- Sou capaz de tornar todos os clichês possíveis. É
só lembrar que o amor é bem maior que qualquer outra coisa.
- Clichê, parte três. E o pior é que sei disso. É
isso que me assusta. Isso me irrita em você, na verdade.
- Tá, você vai esperar eu me emputecer e ir embora
pra me amar? Assim como todos seus amores anteriores? Muda o disco. Me perdoa
se eu te fiz lembrar que a vida é doce.
- É sim. Só que eu sou diabética, acho.
- Me chama de insulina então. Tu me quer. Tu me
adora que eu sei, não adianta dar voltas. Certo?
- Odeio quando tu tá certo. Odeio.
- Então me joga tuas tranças ou tua chave,
“Rapunzel”.
- Quê?
- Tô na frente do teu prédio."
Gabito Nunes, Clichês Possíveis.
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